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Dragão amigo

Conhecido entre os amigos como ~SMaragato~T, Roberto Teixeira é gaúcho, natural de Porto Alegre, cursando Ciência da Computação pela Fundação Universidade de Caxias do Sul. Roberto, que começou na informática com um HotBit (MSX) na década de 80, atualmente trabalha na Conectiva como Analista de Sistemas, após vários anos lidando com bancos de dados. Nas horas vagas gosta de ler (Tolkien e livros de ciências, principalmente física) e de disputar algumas partidas de Quake III com os amigos. Defensor ferrenho do Emacs e colaborador de vários projetos Open Source, entre eles o próprio Emacs e o Englightenment, é um dos Brasileiros que participa do desenvolvimento do KDE, mantendo o arquivador (ark) e colaborando em vários outros aplicativos, como o KMail.

Revista Do Linux: Qual foi o seu primeiro contato com Linux? Qual foi a distribuição?

Roberto Teixeira: No final de 1995 um amigo da universidade me emprestou um CD rosa (sem piadas!) que tinha vindo da Inglaterra. Dentro dele tinha um tal de Linux-FT, uma distribuição da qual nunca mais ouvi falar na minha vida. De qualquer jeito eu a instalei em uma partição de uns 300MB no meu velho 386. Lembro que a primeira coisa que eu digitei depois do login foi 'emacs', pois era o único aplicativo para Linux sobre o qual eu tinha ouvido falar, e me decepcionei quando vi que não estava instalado. Logo depois passei para Slackware e, em seguida, para o Conectiva Linux.

RDL: Quais os projetos do mundo Open Source dos quais você já participou ou participa?

Maragato: No início era o Enlightenment... foi o primeiro projeto em que eu participei mais ou menos ativamente. Eu gostava da proposta do gerenciador e queria brincar um pouco. Passei muito tempo contribuindo para o GNU Emacs até brigar de vez com a FSF por causa do esquema fechado de desenvolvimento do editor. O KDE foi uma surpresa interessante. Ele tem um processo de desenvolvimento muito legal, bastante semelhante ao do Enlightenment em alguns pontos - como receptividade de patches - e muito diferente em outros - como o grande planejamento que o KDE tem. Não pretendo deixar o KDE no futuro próximo. Pelo contrário, eu gostaria de ter mais tempo para ele.

RDL: Qual é o seu papel no projeto KDE?

Maragato: Apenas mais um desenvolvedor. Eu comecei a contribuir quando alguém sugeriu que um grupo de pessoas se concentrasse em verificar os itens encontrados no banco de dados de bugs. A princípio apenas fechava bugs que já haviam sido corrigidos ou que eram inválidos, mas logo comecei a arrumar os bugs mais simples. Depois de um tempo, Christian Tibirna me perguntou se eu podia assumir a manutenção de um aplicativo cujo mantenedor havia simplesmente desaparecido da face da terra (seu e-mail retornava com erro e ele nunca mais deu as caras). Eu aceitei, sem perceber que estava pegando a batata mais quente da história do KDE: o arquivador, talvez o programa mais cheio de bugs da história. Mas isso acabou me levando a mexer na biblioteca KIO (biblioteca de entrada e saída) e criar algumas classes novas por lá. Atualmente mantenho o Ark (mais ou menos - aliás, preciso de ajuda se alguém se prontificar) e algumas partes da biblioteca KIO. Além disso, contribuí com algumas features novas para o Kmail do KDE 3.0, desde que comecei a usá-lo para ler e enviar e-mails, provando que a necessidade realmente é o melhor incentivo.

RDL: O que é necessário para participar do projeto KDE?

Maragato: Não precisa de nada muito especial além de interesse. Quem quer desenvolver precisa de, no mínimo, um pouco de conhecimento de C++ e, de preferência, um pouco de conhecimento em Qt, mas tudo se aprende... Mas há muito mais do que desenvolvimento no KDE. O projeto se preocupa muito com documentação e internacionalização; estes itens não são opcionais como em muitos projetos, mas totalmente integrados ao processo de desenvolvimento de uma versão. Além de documentadores e tradutores, há muito espaço para artistas gráficos também. Em resumo, tem lugar para todo mundo, basta vontade de ajudar e de seguir algumas regras de cooperação e deadlines.

RDL: Por que escolheu o KDE como Interface Gráfica? Que argumentos você usaria para “defendê-lo?”

Maragato: Eu confesso que não gostava do KDE 1.x o achava meio esquisitão. Lembro que fui atraído para o KDE quando as primeiras releases beta do KDE 2.0 saíram. O que me chamou a atenção foi que eles tinham realmente reescrito praticamente tudo. Foi uma reengenharia completa. Achei aquilo fantástico porque a maioria dos projetos tende somente a arrumar os bugs e seguir em frente. É muito difícil tomar a decisão de recomeçar do nada, ainda mais tratando-se de um projeto tão grande. Fiquei tentado, mas o que me levou mesmo ao KDE foi quando a Trolltech, empresa que desenvolve a Qt, decidiu liberar a Qt sob a GPL para acabar com a velha briga FSF vs. KDE, e o Stallman disse que mesmo assim o KDE não poderia ser considerado um software livre enquanto o projeto não pedisse desculpas a todos os desenvolvedores do mundo por anos de desserviço. Achei isso uma afronta e um abuso de poder e na hora comecei do GNU Emacs para o XEmacs e passei a usar KDE. Para defender o KDE eu digo que é um projeto que realmente se interessa por tornar a vida dos usuários mais fácil, sem deixar de agradar os usuários mais antigos. Temos políticas muito fortes de estabilidade (aplicações consideradas instáveis são retiradas da distribuição) e padronização (aplicações têm de seguir as guidelines, o que faz com que as aplicações do KDE sejam tão parecidas entre si). E acima de tudo, é um projeto que faz, que evolui.

RDL: O que você apontaria como pontos positivos de outras alternativas para o Desktop, como o Gnome?

Maragato: Deixe-me dizer que embora haja uma certa rivalidade entre os usuários dos dois projetos, entre os desenvolvedores a coisa é bem diferente. Há muita cooperação entre os projetos. Claro que sendo um projeto que nasceu com o único objetivo de ser uma alternativa ao KDE, a rivalidade sempre existe. De qualquer forma, acredito que o Gnome tenha muita coisa boa. A injeção de dinheiro no projeto tirou ele da estagnação (antes da Ximian/Helixcode e a Eazel o projeto tinha praticamente parado de evoluir), mas eles ainda estão devendo a tão falada versão 2.0. Aliás, acho que o que o Gnome tem de melhor (estou sendo sincero) é a equipe de relações públicas. Como se fala neste projeto! Vira e mexe vem a notícia de que o Gnome vai ter isso, que o Gnome vai ter aquilo. Cada decisão do projeto é levada à mídia. O KDE tem uma crônica falta de pessoas chave, de “caras” para o projeto. O Gnome tem o Miguel de Icaza que age como figura principal do projeto. Mas eu ainda sou muito mais KDE, que evolui mais rapidamente.

RDL: Você poderia nos adiantar as novidades para o KDE 3? Ou A novidade?

Maragato: A novidade não faz muito sentido para o Brasil, já que se trata do suporte total à linguagens bidirecionais. Cada aplicativo tem suas melhorias, mas acho que nenhum evoluiu tanto quanto o Kmail, que está muito mais completo. Há alguns efeitos novos na interface que alguns usuários provavelmente vão apreciar. O Centro de Controle está muito mais amigável e homogêneo. A implementação do Javascript foi quase reescrita e vai estar muito boa. Tem coisa demais para mencionar, só vendo a página do KDE :-)

RDL: Tem alguma razão para o KDE ter a interface semelhante à do Windows?

Maragato: Não acho o KDE tão parecido com o Windows como muitos dizem por aí. O que pode dar a impressão de semelhança é que o KDE não tem (ou pelo menos desativa por padrão) grandes efeitos de transparência e cores que muitas interfaces têm. Mas acho que os usuários não querem isso, desejam poder trabalhar confortavelmente. Muita gente pega uma interface colorida e acha a coisa mais linda do mundo, mas três dias depois começa a desativar efeitos porque, no fundo, muito enfeite só serve para atrapalhar e “comer” processamento.

RDL: Mesmo sendo um defensor do KDE, você poderia apontar algumas falhas que a interface possui e que ainda precisam ser trabalhadas?

Maragato: Ele é “leeeeeento”. A maioria das pessoas não consegue usar o KDE com menos de 128MB de memória. Processamento também ajuda bastante. A performance é com certeza o maior problema do KDE. Algumas coisas são solucionáveis pelo projeto, outras não. Muito da lentidão do KDE se deve ao ldd do Linux ser extremamente ineficiente. Além disso, a implementação da biblioteca C++ do projeto GNU é terrível. Some-se a isso o gcc, que tem ficado pior a cada versão (pelo menos em relação ao C++), e tem-se grande parte da lentidão do KDE. Claro que não é só isso, o KDE usa muita memória, mas não tanto quanto muitos pensam. Atualmente é mais interessante ter mais processamento do que memória, em relação ao KDE, tudo por conta dos problemas mencionados acima. Alguma coisa foi melhorada com o object prelinking de um funcionário da AT&T, mas isso ainda está um tanto instável no momento, não funcionando confiavelmente.

RDL: Você mesmo disse que o problema do KDE é a lentidão. Então como um usuário final vai usar uma interface que tem problemas de velocidade? Será que essa questão não prejudica a adesão da interface? E, além disso, não atrapalha o crescimento do Linux, do qual se afirma ser muito mais rápido?

Maragato: E o Linux não é mais rápido? Acho que sim. Empresas que desenvolvem para Linux constantemente dizem que se impressionam com a performance superior de seus aplicativos nesta plataforma. Não sou eu quem está dizendo isso, e sim alguns clientes da empresa onde trabalho. Quando eu disse que o maior problema do KDE era a performance, não quis dizer que ele era uma carroça, mas sim que não era tão rápido quanto gostaríamos que fosse. Onde trabalho são desenvolvidos projetos de máquinas thin clients usando o KDE. São máquinas com 32MB de memória e processadores modestos que executam o K Desktop razoavelmente bem. A questão não é comparar o Linux com outros sistemas operacionais, pois não tenho dúvidas de que ganharemos, mas sim comparar o KDE com outros desktop dentro do próprio Linux. Acho que o pessoal do Linux tem padrões mais elevados que o de outros sistemas, por isso exigimos mais.

RDL: Além da QT existe outro elemento técnico que ajudou o KDE a chegar ao estágio atual?

Maragato: Acima de tudo, acho que é a estabilidade. Muita gente diz que os aplicativos do “concorrente” parecem todos extremamente instáveis. O KDE tem uma estabilidade invejável a muitas interfaces (não me refiro só ao Linux). Além disso, acho que a preocupação em atender os desejos dos usuários está rendendo seus frutos agora, pois temos um ambiente relativamente completo e bem de acordo com o que a maioria das pessoas precisa.

RDL: Em projetos Open Source, como são definidos os elementos didáticos de um sistema? Por exemplo, no KDE, que é uma interface gráfica e precisa ser amigável para o usuário, quem define tamanho de ícones, padronização de cores, disposição dos elementos na tela e todos os outros elementos que compõem o conjunto?

Maragato: Como em qualquer outro projeto aberto, é tudo evolução. Tenta-se fazer de uma maneira e depois alguém vê que não estava legal. Algumas pessoas que realmente entendem do assunto contribuem com idéias para o projeto e a coisa vai evoluindo. Existe um subprojeto no KDE chamado KDE Usability Study. Trata-se de um esforço para estudar a usabilidade de cada aplicação do KDE e ver o que deve ser melhorado. Qualquer usuário pode contribuir para este projeto, bastando escolher uma aplicação, se cadastrar e depois fazer um relatório. O KDE é lento, mas não uma carroça. Há Thin Clients com 32 MB de RAM rodando-o bem


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