Vida fácil
Ao considerar os temas para a coluna deste mês, acabei tropeçando na nostalgia. O Linux já completou 11 anos, a RdL vai fazer 3 anos, meu site já passou dos 5 anos e, certamente, já vi passar muita água por baixo da ponte. Mas o que ocorreu comigo é mais freqüente entre poetas e romancistas do que entre administradores de sistemas: tive lembranças agradáveis dos tempos difíceis que ficaram para trás. Horas e horas para configurar meu primeiro modem, ainda com conexão SLIP (PPP era um sonho distante), a primeira visão do modo gráfico (640 x 480, 16 cores), a primeira compilação e instalação bem-sucedida de um kernel, o primeiro servidor a completar 6 meses de uptime... Coisas que hoje são corriqueiras e que até nem se fazem mais - há muito tempo, todo o meu hardware é reconhecido automaticamente por todas as distribuições de Linux que testo nele, por exemplo; nada de ficar horas tentando configurar um modem, monitor ou placa de vídeo, e nem lembro da última vez que tive que compilar um kernel para garantir o suporte a algum dispositivo.
Quando comecei a colaborar com a RdL, ainda usava o Linux em modo texto e enviava os artigos para a redação através de uma conexão Internet discada, por uma linha emprestada de um vizinho, porque não havia telefones disponíveis no meu bairro. Hoje, não apenas há uma relativa fartura de telefones disponíveis em boa parte das regiões, como ainda a Internet de banda larga virou realidade na maioria das cidades médias e grandes – e, em geral, com compatibilidade plena com o Linux, como no caso do cable modem instalado aqui na escrivaninha. O modo texto também ficou no passado, e hoje uso processadores de texto poderosos e fáceis de usar, 100% livres, em ambientes gráficos estáveis e esteticamente agradáveis, com desempenho adequado e a segurança característica do Linux.
Aliás, a experiência de utilização do Linux em modo gráfico mudou muito nestes anos. Além de aplicativos de produtividade como o OpenOffice, o KOffice e o AbiWord, temos ambientes gráficos completos, bonitos e funcionais. Temos ferramentas de rede modernas como o Evolution e o Mozilla. Temos suporte a hardware. Temos bancos de dados. Temos sistemas de arquivos modernos e seguros. Temos a maior parte dos componentes que em 1997 eram sonhos distantes.
Nessa vida fácil que os desktops modernos baseados em Linux proporcionam aos usuários da velha guarda, só o que não temos é aquela velha emoção nascida da genuína surpresa de ver um hardware “difícil” ser suportado, ou uma máquina “problemática” finalmente dar boot.
O lado bom: os desktops Linux nunca foram tão fáceis de usar.
O lado ruim: que saudade de passar madrugadas lendo HOWTOs e recompilando o sistema todo para ver se o modem começava a discar...
GNOME x KDE x Red Hat
legenda: GNOME ou KDE?
As semanas que antecederam o lançamento do Red Hat 8 estiveram carregadas de notícias sobre as alterações que a empresa realizou no KDE de forma a torná-lo mais integrado (e semelhante) ao GNOME, ambiente gráfico padrão em seus produtos. Já falei sobre essas disputas entre projetos do software livre e não quero entrar novamente nesse mérito. O que chama a atenção neste caso é que a Red Hat afirma que, de fato, queria prestar um serviço aos seus usuários ao aproximar e unificar as configurações de ambos os sistemas, mesmo que isso significasse alterar significativamente o KDE contrariamente às idéias dos mantenedores desta interface gráfica. Trata-se de software livre e, portanto a Red Hat tem (ao menos em tese) pleno direito de fazer as alterações que desejar, certo? Mas em se tratando de uma empresa que vive numa comunidade de desenvolvedores livres, não deveria haver maior respeito pelas idéias dos desenvolvedores dos projetos utilizados nos produtos empacotados por ela?
Não tenho uma resposta, mas creio que a reflexão sobre o assunto é válida. O que você acha? Mande-me um e-mail comentando como você vê a questão da responsabilidade das empresas distribuidoras em relação aos projetos de software livre. Tenho interesse em saber a sua opinião.
O lado bom: de fato, configuração unificada seria algo positivo.
O lado ruim: isso deveria ser implementado de comum acordo entre os desenvolvedores de todos os projetos envolvidos, e não em favor de um e em detrimento do outro...
Augusto Campos -
brain@matrix.com.br