"Ainda há muito o que se fazer"
Muitos leitores pediram e, nesta edição, o entrevistado da Revista do Linux é Sandro Nunes Henrique, presidente da Conectiva S/A. Sandro é um dos fundadores da empresa, fato que fez com que ele se tornasse uma das pessoas mais conhecidas na comunidade de Software Livre no Brasil. Ele iniciou a sua carreira em 1978, no Banco do Brasil, atuando sempre na área de tecnologia, e participou de diversos projetos na área bancária, como sistemas de depósitos on-line, home banking e front end. Volta e meia, Sandro percorre o país para divulgar as ações da Conectiva, e as suas palestras já são bem conhecidas, principalmente pela descontração. Para Sandro, todo o seu fascínio pelo mundo do Software Livre pode ser resumido em apenas uma frase. "A capacidade de reunir objetivos e grupos tão díspares em torno de um objetivo único", filosofa
Revista Do Linux - Como você avalia as propostas do governo Lula para a área da Informática?
Sandro Nunes Henrique - É prematuro falar de ações práticas, porém a comunidade de desenvolvedores tem uma grande expectativa de que haja um impulso no uso do Software Livre. Isso se deve à histórica aproximação e defesa do Software Livre pelo Partido dos Trabalhadores, entre outros, assim como pela orientação de economia e priorização de gastos dos recursos da União. Parece-nos que o Software Livre poderá desempenhar um papel importante, quer sob a ótica da coerência com a filosofia partidária, quer sob o ponto de vista da operacionalização do programa de governo do Presidente Lula.
RdL - E em nível estadual, em que estados você crê que o Linux possa se popularizar mais?
SNH - Os estados, de maneira geral, mostram-se muito receptivos à adoção do Software Livre, especialmente premidos pela necessidade de realizações necessárias ao desenvolvimento local, assim como pelas contenções financeiras generalizadas. Evidentemente, há diferenças na velocidade de adoção, mas praticamente todos têm projetos em andamento baseados em Software Livre, com destaques para as áreas de saúde e educação.
RdL - Quais as perspectivas de negócios da Conectiva para 2003?
SNH - Com o lançamento do UnitedLinux para as plataformas de mainframe e IBM RISC, além dos servidores Intel e sua conseqüente homologação junto a grandes fabricantes de software e hardware, cremos que o Linux no Brasil poderá contar com produtos e serviços de alto nível para implementação no meio corporativo privado e público. Planejamos ainda fortalecer o programa de treinamento adequando-o aos padrões definidos pelos sócios da UnitedLinux, dentre os quais a própria Conectiva. Temos uma meta de crescimento de mais de 50% para este ano, e todas estas iniciativas são fundamentais para o seu sucesso.
RdL - A Conectiva se mantém ao longo dos últimos anos como referência nacional no mercado de softwares, principalmente em sistemas operacionais para servidores. A empresa manterá esse foco ou diversificará suas atividades?
SNH - O foco da companhia está no Software Livre, porém não somente no fornecimento do software, mas também no treinamento, suporte, desenvolvimento de projetos, customizações, portes, enfim, nos serviços relacionados com o Software Livre e especialmente com o Conectiva Linux e agora também com o UnitedLinux. Além do mercado de servidores, a empresa atua fortemente nos segmentos de estações de trabalho e soluções embarcadas.
RdL - O Conectiva Linux Enterprise Edition (CLEE) direciona a Conectiva para o segmento corporativo de médio e grande porte. Essas empresas estão preparadas para adotar o pingüim?
SNH - Creio que, na verdade, elas necessitam dessa mudança. O mercado demonstra claramente sinais de desgaste em relação ao modelo do software proprietário. O CLEE se apresenta como uma alternativa para aquela empresa que necessita ter um alto nível de serviços, porém quer racionalizar seus custos, especialmente aqueles relacionados com licença de softwares. Diversas pesquisas apontam para uma economia de pelo menos 50% ao se adotar Software Livre. É extremamente atrativo para qualquer CIO que cada vez mais precisa fazer mais com menos.
RdL - De que maneira as empresas de médio e grande porte podem ser beneficiadas com o Linux?
SNH - Economia, segurança, estabilidade, robustez, diversos fornecedores, possibilidade de customização, alto nível de atualização, provedores locais de alto nível, funcionalidades de alto nível, entre outros, são os benefícios diretos e concretos na adoção do Linux. Quando uma empresa tem dúvida sobre se vai poder ou não se beneficiar das virtudes do Software Livre, sempre recomendamos um processo de levantamento de base instalada e seu comparativo com soluções abertas. Na maioria absoluta dos casos, os ganhos são substanciais e relacionados com os benefícios citados.
RdL - O Conectiva Linux 9 sairá este ano? Que novidades você pode adiantar?
SNH - Ainda na primeira metade deste ano, a Conectiva lança a sua nova versão do CL. Como de praxe, teremos centenas de softwares atualizados, os últimos lançamentos realizados pela comunidade desenvolvedora, além das contribuições inseridas pela Conectiva. Cabe citar o novo kernel, que quando disponível permitirá, em muitos casos, que os equipamentos atuais que executam Linux fiquem ainda mais eficientes. Este espírito que permeia a comunidade é muito importante: em primeiro lugar, vêm os interesses dos usuários: em vez de atualizar o seu equipamento por usar uma versão mais recente do sistema operacional, o usuário terá mais qualidade em seu equipamento atual.
RdL - Quando você resolveu sair do Banco do Brasil para fundar a Conectiva, o que tinha em mente? Que dificuldades iniciais você enfrentou e como elas foram superadas?
SNH - O trabalho na Conectiva tem sido muito gratificante, pois permite que se tenha uma empresa privada, que visa o lucro, o seu crescimento e a satisfação de seus acionistas, com o sentimento de se estar atuando em algo positivo, correto e de grande importância para o Brasil e o restante do planeta, já que o trabalho que desenvolvemos é devolvido à comunidade na forma de software aberto. Ser reconhecido e convidado a participar de uma iniciativa que envolve a maioria das principais distribuições Linux do mundo, como no caso da UnitedLinux, é para nós um reconhecimento de que todo este trabalho tem sido percebido em escala global. Das dificuldades, a que mais me chama a atenção é o quanto ainda há por fazer, quanta demanda existente, que procuramos da melhor forma responder, porém, com muito ainda por ser desenvolvido.
RdL - A concorrência com a Red Hat, que já tem uma filial no Brasil, assusta a Conectiva?
SNH - O mercado é muito maior que a Conectiva e a Red Hat juntas. Ou seja, mais do que concorrer, creio que uma unidade da Red Hat no Brasil venha, na verdade, ajudar a desenvolver o mercado.
RdL - Na sua opinião, as pessoas estão prontas para o software livre? De que maneira o Linux pode ser disseminado no Brasil?
SNH - Sempre que iniciamos um projeto de adoção em massa de SL, sugerimos um trabalho de conscientização dos usuários sobre o porquê das mudanças. As pessoas não têm que mudar para algo pior do que elas têm hoje. Pelo contrário, a mudança deve ser sempre evolutiva. Em muitas situações o Software Livre produz isso, porém, é aconselhável que as pessoas entendam a mudança e sejam inseridas dentro dos conceitos e benefícios que permeiam a adoção do Software Livre. A resistência é natural, especialmente quando não se tem consciência de que se trata de uma mudança positiva sob diversos aspectos, não somente o tecnológico.
Rodrigo Asturian - asturian@RevistaDoLinux.com.br