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CORPORATIVO
A Cyclades consolida-se como um dos
melhores fornecedores de hardware para Linux e quer ampliar sua
participação no mercado mundial. A Alemanha é o próximo alvo
No começo dos anos 90, João Lima
desembarcava nos Estados Unidos com uma missão impossível: Instalar uma
fábrica e conseguir negócios no fechadíssimo mercado norte-americano.
Segundo ele, “tudo lá é acessível, basta ter dinheiro. Se quiser abrir uma
empresa, em menos de uma semana você a terá, pois tudo é fácil e não há
burocracia alguma”. Mas, depois de começar sua empreitada, João ainda teria
a terrível incumbência de conseguir viabilizar um negócio num mercado cuja
característica principal é o protecionismo ferrenho. Com muito pouco
dinheiro e uma vontade “sertaneja”, todos os dias, enquanto dirigia na
volta para casa, João tinha um olho na estrada e outro no céu perguntando:
“Como é que eu vou fazer? Tem que haver um jeito. Deus, dê-me uma luz, um
caminho a seguir...”.
Sua empresa, a Cyclades, uma
pequena fábrica brasileira de equipamentos de rede, havia concluído que se
quisesse continuar a produzir sua linha de equipamentos, ao invés de se
tornar mera distribuidora das grandes empresas americanas ao longo dos
anos, teria que tentar se impor no mercado internacional, mais precisamente
nos Estados Unidos.
Nem é preciso dizer que o começo
foi desanimador, mas um misto de política de persistência, acaso e
isolamento comercial fizeram sua atenção se voltar para as súplicas de um
pequeno gueto na época: “Vocês não têm uma solução para Linux? Haveria a
possibilidade de vocês escreverem um driver?”. Não foram poucas pessoas que
João atendeu com essas consultas e, apostando nesse mercado, toda a
Cyclades arregaçou as mangas, começou a escrever drivers e a estudar as
características de roteamento do Linux para projetar novos equipamentos.
Esse casamento tornou-se profícuo e indissolúvel, levando a empresa a se
projetar no cenário internacional.
Anos depois, rememorando as
dificuldades iniciais, o sócio que ficou no Brasil garantindo a retaguarda,
Daniel Dalarossa, e João Lima, esse tecno-bandeirante que foi “cutucar a
onça com vara curta”, pela ousadia de ir desbravar um território em que a
sobrevivência é literalmente uma batalha, ostentam no currículo da Cyclades
os prêmios de “Melhor Hardware de Linux”, da prestigiada revista Linux
Journal, por seis anos consecutivos e mostram um perfil vencedor. Com um
faturamento de US$ 16 milhões anuais e 130 funcionários, a matriz hoje está
nos Estados Unidos e tem filiais na Inglaterra, Alemanha, Filipinas e no
Brasil, é claro. Tem representantes em mais de 20 países e exportam até
para lugares como Bangladesh, Albânia, Tchecoslo-vá-quia e Croácia. Nos
últimos tempos, enquanto Daniel comandava a corpora-ção nos Estados Unidos,
João Lima, que terminou virando o Sr. John Lima durante seus anos por lá,
voltou a sentir “saudades da estrada” e bandeou-se para a Alemanha para
explorar melhor os mercados que estão emergindo com a explosão européia do
Linux.
Recentemente a empresa lançou o
arrojado projeto NetLinOS, aberto para todos os que possam contribuir para
aprimorar as tecnologias de conectivi-dade do Linux. Essa nova aposta da
Cyclades é promissora o suficiente para provocar grandes alterações no
mercado, principalmente se houver um crescimento vertica-lizado de Linux na
área de aplicações de rede, coisa mais que provável, ainda mais se
considerarmos as estatísticas e projeções dos maiores institutos
internacionais de pesquisa. Para saber mais sobre a Cyclades a RdL foi
entrevistar João Lima durante sua últi-ma visita ao Brasil.
A empresa
foi premiada por seis anos consecutivos pela prestigiada
publicação Linux Journal
RdL - Como estão as operações da Cyclades na
Alemanha?
JL - Não existem barreiras de importação
entre Alemanha e Estados Unidos, e, como a Europa vive ago-ra uma explosão
de Linux, está bem acessível fazermos grandes negócios por lá. Somos muito
conhecidos na Europa como uma empresa de soluções baseadas em Linux e
nossos prêmios de “Melhor Hardware”, nos concursos da revista Linux Journal
nos últimos anos, nos precedem em todos os contatos comerciais. Quando
lembro dos nossos primeiros anos nos Estados Unidos e comparo com o
panorama da Alemanha de hoje, sinto uma diferença brutal. Aquilo sim foi
difícil. Aqui há uma consciência social forte, e a adesão à causa Linux é
um fator bem mais importante que nos Estados Unidos. Por enquanto...
RdL - Poderia contar como o Linux contribuiu
nas suas soluções?
JL - Em termos bem práticos: as
capacidades de roteamento do Linux nos permitiram projetar equipamentos com
menos componentes, com custos mais competitivos e muitas soluções via
software. Ele está intrinsecamente ligado ao sucesso de nossa empresa.
Como o segmento de Network Appliances em que atuamos ainda engatinha em
termos de software livre, temos uma ferramenta que desequilibra a
concorrência.
RdL - Quando você fala em concorrência,
pensamos logo na gigante da área, a Cisco. Fale-nos um pouco da dificuldade
de atuar nesse mercado e também das diferenças entre os países para os
quais vocês exportam.
JL - A fase que vivemos atualmente, com
parcerias de peso como no caso da Cobalt nos Estados Unidos, e com as
soluções que temos, com preços mais acessíveis, estão nos permitindo entrar
com segurança em terreno “minado”, o middleware. Sem Linux, não haveria
como sonharmos com isso. Esse foi o motivo de patrocinarmos um projeto
aberto, o NetLinOS, para que possamos “cortar” um sistema sob medida para
qualquer solução de conectividade. Não se trata de uma nova distribuição,
mas de um sistema totalmente orientado para hardwares específicos. Faço
questão de frisar que esse projeto é aberto, qualquer um pode contribuir ou
usufruir de suas soluções. Convidamos os interessados a visitar o portal
www.netlinos.org para saber mais detalhes desse projeto. Quanto às
diferenças entre países, poderia ficar falando por horas, mas, a título de
exemplo, enquanto no mercado americano vendemos mais placas multi-seriais,
no Brasil a preferência é por roteadores; enquanto na Alemanha o custo não
é tão importante quanto a performance, na Croácia e no Brasil, este quesito
tem um peso muito grande. De qualquer forma, se a questão é perfor-mance,
ou custo, ou tecnologia de conecti-vidade, o Linux é ideal para qualquer
uma delas.
RdL - Parece que você gosta do papel de
desbravador, não é?
JL - A experiência nos Estados Unidos
foi magnífica, aprendi muita coisa nos anos que passei na Califórnia.
Parecia que eu acordava todo dia para quebrar pedras e tudo foi conquistado
com um esforço fenomenal, mas realmente valeu a pena. Tudo naquele mercado
é superlativo, é “huge”, é “big”, mas em contra-ponto à filosofia do “o
dinheiro é a coisa mais importante na vida”, que os americanos prezam,
agora vivo em uma sociedade em que os valores são diferentes.
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